sábado, 9 de outubro de 2010

Tropa 2: Faca na caveira

Como grande parte da massa que desde ontem se concentra nos cinemas brasileiros, eu também estava louca para assistir Tropa de Elite 2. E qual não foi a minha surpresa quando meu querido editor perguntou se eu queria 2 convites cedidos pelos patrocinadores do filme para assistir à pré-estreia, na quinta-feira? Se eu queria? É pra responder mesmo? :)

Lá fomos nós, o boyfriend e eu, felizes, ter nossos celulares lacrados na entrada do cinema - sim, a estratégia neurótica de segurança de José Padilha contra a pirataria chegou a esse ponto. Mas quem se importa, né? Confisquem! Tudo pelo amor à arte e pela defesa dos direitos autorais.

O filme

Minhas expectativas, baseadas na primeira versão, - e também no fato de que os produtores não se contentariam com algo inferior a ela - eram as maiores possíveis. E foram absolutamente correspondidas. Tropa 2 é muito bom! Tem tudo o que fez do primeiro um grande longa, com um adicional: potencializa seu caráter de crítica social ao trazer a questão das milícias como tema central - algo que já sabíamos desde que começaram a pipocar informações sobre o filme na imprensa, mas que fez toda a diferença.

O roteiro de Padilha e Bráulio Mantovani é ótimo. Mais complexo que o anterior, articula bem os elementos que contam a história do agora Coronel Nascimento, 10 anos mais velho. E mantém as doses de ironias e bordões que, em meio a tanto sangue, tiro e conflito, conseguiram dar a um filme pesado alguns momentos leves. As cenas aéreas são muito bem feitas, as ações todas muito convincentes. Wagner Moura - nunca me cansarei de falar - incrível, p#$% ator. Neste segundo filme, Nascimento aparece mais humano, mais falível, menos herói. Gostei. E Seu Jorge? Gente, que máximo ver Seu Jorge tão bem, tão dentro do papel. hahaha Culpa de Fátima Toledo?

Tocando na ferida

A história que Tropa 2 se propõe a contar é, mais uma vez, a da violência, da guerra urbana na cidade do Rio, da força bruta do Bope e dos policiais corruptos. Mas a abordagem, ainda que na ficção, da ligação do Estado com a máfia miliciana foi o elemento novo, a coisinha a mais para o espectador pensar quando sai do cinema. Não queria entrar nesse blá blá blá de choque de realidade porque os arrastões, os assaltos e o crime organizado estão aí o tempo todo pra nos lembrar do que nos cerca. Mas, na minha esperança romântica e utópica, mostrar como os políticos* participam desse cenário imundo e de insegurança generalizada em que vivemos talvez faça o público refletir que, em algum momento, também somos coniventes com o sistema. Votamos, colocamos os bandidos de terno todos lá. Peraí, a eleição não foi semana passada? Bad timing. #fail

Parênteses. A pergunta que todo ser pensante provavelmente vai fazer, espontaneamente, eu também fiz: por que RAIOS esse filme não estreou antes das eleições? 'Leis de incentivo a cultura e apoio da Prefeitura do Rio devem explicar', pensei. Estrear exatamente 3 anos após o 1º, em 8 de outubro, foi a desculpa que encontraram pra não dizerem que a arte no Brasil, para ter recursos, acaba precisando se submeter ao poder público antes de falar mal dele. Fecha parênteses.

A situação do Rio de Janeiro dá a Tropa de Elite 2 o luxo de dispensar a tecnologia 3D. Ele tem a seu favor uma bela ambientação que acontece antes do público entrar no cinema e continua quando as pessoas voltam pra casa. Sim, porque, no momento em que eu deixava o shopping onde assisti o filme, bandidos roubavam um carro 2 ruas atrás. E no bairro vizinho outro bando de criminosos invadia um prédio. Tá bom pra você?



* Dá raiva ouvir políticos dizerem no horário eleitoral que "o Rio hoje vive em paz". Paz? Defina, por favor. Não é da mesma coisa que estamos falando.



quarta-feira, 6 de outubro de 2010

Persona

Felizes são os escritores. Os ficcionistas, eu quero dizer. Sim, porque eles podem fazer o que quiserem e seus personagens jamais irão reclamar. É sobre isso que venho pensando nos últimos dias: como o indivíduo retratado em um texto pode intervir no trabalho de quem escreve. No caso, o jornalista.

O repórter faz perguntas, o interlocutor responde como lhe convém. Seleciona o que vai dizer de acordo com o que interessa a ele que seja publicado. Quem escreve tem o compromisso de ser fiel àquelas respostas, ou ao menos às ideias gerais nelas contidas. Texto publicado: que atire a primeira pedra o jornalista que nunca teve uma personagem que se rebelou quando viu o produto final.

Por mais cauteloso e isento que tente ser, o criador corre o risco de desagradar a criatura (que não foi criada por ele, diga-se de passagem). Fico imaginando como deve ser difícil o trabalho de um biógrafo, principalmente de obras autorizadas, quando na maioria das vezes toda sua produção está sujeita à aprovação do seu "objeto" de estudo. Não bastasse o gigantesco processo de pesquisa, ele tem diante de si uma vida a retratar que é, ao mesmo tempo, um filtro. Uma peneira que pode pegar justamente os caroços que enriquecem uma história.

E os dramaturgos? Estes sim vivem situação curiosa: criam a personagem da maneira que entendem ser melhor para a trama. Aí vem o ator, todo metido à besta, e transforma o X em Y. Às vezes, o resultado final é melhor que a ideia inicial. Em outras, é catastrófico. Problemas no processo podem até levar a consequências "mais graves". Pra facilitar, o criador mata a criatura. Ou inventa uma viagem, um final feliz antecipado e, de quebra, se livra do intérprete problemático. E o jornalista? Faz o quê?

Bons jornalistas, tenho aprendido, são aqueles que não se permitem pautar pelo entrevistado. Conseguem extrair não o que ele deseja dizer, mas o que realmente importa para aquela matéria. O que motivou a escolha daquela pauta, em meio a tantas outras. Fiel às respostas, ciente do que escreve - e, nunca é demais, seguro graças a belas provas concretas. O gravador pode ser o melhor amigo.

Construir personagens é uma delícia. Imaginar como seria alguém, buscar sentir o que esse alguém sentiria, determinar e executar suas ações... (Stanislavski explica melhor que eu). Mas tão desafiante quanto é trazer quem já existe para o papel.


***

Uma pessoa que detesta coisas desatualizadas e "abandona" seu blog à própria sorte durante um mês merece o quê?
R: Sentir-se mal e voltar ao bloco de notas quando constata que estava morrendo de saudades de escrever aqui. E enfiar na cabeça que falta de tempo não pode virar desculpa para não postar. Dealt!*

*Que drama, mas ok. Tem a ver com nossos temas aqui.